O termo “animal político”, cunhado por Aristóteles na obra Política, originalmente descrevia o ser humano como naturalmente inclinado à vida em sociedade e à participação no governo da polis. O filósofo grego entendia que a virtude política residia na capacidade de agir segundo princípios éticos, buscando o bem comum e a justiça social. No entanto, no século XXI, esse conceito ganhou contornos mais duros e pragmáticos. O animal político contemporâneo é definido pela realpolítik e pelo pragmatismo absoluto: ele muda de alianças, ideologias e posições conforme a conveniência, colocando sua sobrevivência e influência acima de qualquer coerência moral ou compromisso com a sociedade. Leis que aumentam a exclusão social, reduzem direitos ou expõem vidas a riscos são aprovadas com plena consciência de seus impactos, desde que beneficiem corporações, patrocinadores e grupos de interesse que controlam o poder real. Como disse Maquiavel, “o fim justifica os meios” continua sendo o guia não declarado da política moderna, praticada no Brasil.
A trajetória de Sassá Mutema, personagem emblemática da televisão brasileira, ilustra de forma simbólica essa dinâmica. Inicialmente ingênuo e analfabeto, é eleito como prefeito do povo. Ele foi manipulado pelos verdadeiros financiadores de campanha e dominadores do poder. Mas, com o tempo, aprendeu as regras do jogo político e passou a operar segundo a lógica do pragmatismo político sem a ética inicial. Suas decisões deixam de refletir o bem comum e passaram a atender interesses convenientes, garantindo sua sobrevivência no jogo e força política. A pureza inicial se perdeu e o idealismo foi tragado pelo sistema, mostrando como a política pode transformar inocentes em peças funcionais da máquina de poder. Quem resiste é eliminado.
Porém, a despolitização da sociedade cria o terreno fértil para essas manipulações. Ao reduzir o engajamento cívico a ações maniqueístas de bem e mal, sempre manipuladas, se enfraquece o debate público, a população se torna submissa a um lado e com isso permite que animais políticos, associados a corporações, conduzam decisões de interesse próprio com resistência mínima da sociedade. Daí, no vácuo deixado pela ausência de fiscalização e crítica consistente, figuras como a personagem Sassá Mutema evoluem no jogo político sem que a sociedade perceba, de representantes ingênuos a operadores do Establishment. Montesquieu advertia que “a corrupção dos princípios é tão perigosa quanto a corrupção das leis”, observação que se aplica com rigor à política contemporânea.
Em oposição a isso, a política ideal seria guiada por princípios éticos claros, coerência e compromisso com a justiça social. O político ideal enfrenta pressões externas, mantém integridade e prioriza o interesse coletivo sobre o ganho pessoal. Na prática, políticos com tais perfis são frequentemente rotulados como ingênuos ou tolos, enquanto que parte da sociedade celebra e aplaude aqueles que se adaptam, negociam e sobrevivem na realpolítik. Isso mesmo que desonestamente. O drama de Sassá Mutema demonstra que aprender a jogar é quase sempre aprender a perder a pureza, e que o idealismo, por mais admirável, tende a ser absorvido pelo pragmatismo impiedoso da prática do poder.
E os que se recusam a se vender ao sistema corruptor e manipulador, o que acontece a eles ? São traídos e excluídos sumariamente do jogo, e não raramente com a participação tácita de todos os lados, mesmo entre aqueles que dizem se mover por ética ou princípios nobres. Essa é a realidade crua, nua, dura e cruel. Mas ainda resta a esperança de que um dia o povo aprenda a votar.
Teobaldo Pedro.Juazeiro-BA.
